#2 – Descobrindo | As Quatro Nobres Verdades – Ações de corpo, fala e mente.

Tempo estimado de leitura: 4 minutos

Uma breve apresentação das etapas de purificação, pacificação e cura em aspectos de corpo, fala e mente. 

Onde estamos?

p.17 e 18 do texto “As quatro nobres verdades e o caminho óctuplo”. 

O texto completo está disponível aqui →

Darma da vez

A única solução para a roda da vida é a liberação. Então a única solução é a lucidez em todas as circunstâncias da roda da vida, essa é a única saída. Por exemplo, o celibato é uma forma de ação hinayana, ou seja, não é que não haja os impulsos e todas as complicações acontecendo, é que não praticamos as ações não virtuosas, algo do tipo “eu não mato porque eu não mato, mas que eu tenho vontade de matar eu tenho”. Isso significa que o impulso está presente.

Então o impulso é o ponto principal. No nível da mente, é como se praticar ou não praticar tivesse pouca diferença, pois se impulso está lá, estamos com o sintoma que brota da quebra da motivação e assim as causas do sofrimento estão instaladas. A única chance de podermos andar em samsara é como um Bodisatva, não existe outra forma, caso contrário, comer é roubar. Porque estamos gerando apego, “esta comida é minha, ela não é sua, se eu não comer eu morro, como é que eu faço?”, e assim tem todas as contradições. Só a liberação é a solução. Eu não sei se existe alguma outra tradição que acredite em harmonia no meio dessa circunstância, mas no budismo não há possibilidade.

Por outro lado, a vida dentro da perspectiva de um Bodisatva é algo possível, temos apenas que avançar em nossos vários passos até chegar pelo menos no embrião de compreensão da natureza da liberação. Então podemos tomar refúgio. E assim, quem tomou refúgio verdadeiramente pode andar, pois já não há mais por base os impulsos ligados à roda da vida, há uma outra perspectiva.

Nessa perspectiva, o budismo é o caminho direto, dessa forma como estamos olhando. Se não estamos olhando o budismo dessa forma direta, então o olhamos como um caminho longo, é como se ele não tivesse fim. E então apenas devemos ir fazendo certas coisas, e vamos melhorando. Vemos que se praticarmos mesmo que limitadamente, aquilo trará resultados positivos. Mas se não praticarmos aquilo, teremos problemas, que é o que normalmente acontece. E lastimo, e para mim é uma surpresa um tanto aflitiva, porque somos novos budistas, pois o budismo no ocidente é recente, acreditamos que o final é possível. Mas quando vamos encontrando os povos de tradições budistas antigas, vamos ver que surgiu também uma hipocrisia, assim como surgiu em outras tradições. As pessoas ouviram os ensinamentos, sabem direitinho o que deveriam e o que não deveriam fazer, mas elas alegremente subvertem as regras.

Eu já tive a experiência de encontrar pessoas que fizeram escola monástica por sete ou dez anos, e eles sabem recitar perfeitamente o que eles devem e não devem fazer, mas não tem um bom comportamento. Eles têm um comportamento subversivo e pagam por isso. Isso é heresia grossa. Mas isso não significa que a pessoa está livre daquilo. Elas fazem aquilo e o mundo desaba sobre suas cabeças. Isso surge num estagio médio quando não há verdadeiramente o desejo de atingir a liberação, e a pessoa se torna um ser herético. Então esse é o problema, ou seja, ouvir os ensinamentos e distorcê-los ou esquecê-los ou não praticá-los.

Mas se pegarmos essa estrutura das ações não virtuosas e nos colocarmos pessoalmente dentro disso e dissermos “eu isso, ou eu não isso, eu não aquilo…”, então estaremos construindo uma identidade e essa identidade vai começar a enfrentar problemas, porque os impulsos seguem. Então aqui vamos olhar sob uma outra perspectiva, que é a perspectiva do impulso, não estamos olhando na perspectiva da culpa, de uma identidade, mas na perspectiva de que surgiu um impulso e ele significa tais coisas e olhamos com o olho de sabedoria.

Se seguirmos o impulso, vamos apenas observar, e vamos encontrar depois as estruturas de sofrimento. A nossa estrutura de lucidez não está baseada na noção de que existe alguém que tem força e que vai segurar algo, mas está baseada na lucidez. Ela não está baseada numa paisagem dentro da roda da vida, onde os impulsos brotam e vamos tentar ser mais forte para derrubar aquilo. Não seguimos dentro desta perspectiva, onde haveria uma estrutura de uma identidade lutando no território hostil, algo do tipo, Hércules, ou seja, a determinação espiritual lutando contra um impulso terreno, natural, inesgotável, que é o Anteu. não vamos operar dentro disso. Não tem um Hércules. não somos super heróis e nem precisamos de super heróis.

Nós vamos desarticular os impulsos numa outra paisagem. Mesmo que usemos uma nomenclatura de identidade, vamos estar trabalhando num nível mais sutil, num nível onde estamos trabalhando com a vacuidade. Os vários impulsos, os vários mecanismos não têm o poder que parecem ter, quando deslocamos esses mecanismos de dentro da estrutura da paisagem onde a identidade faz sentido.

Aqui estamos começando a fazer isso. Vamos aprofundar mais e mais na sexta, sétima e oitava etapas. Eu acredito que não haja outra possibilidade. Então quando tentamos resolver a nossa situação no nível da identidade, vamos terminar entortando. É como querer que um prego entre numa barra de ferro, podemos bater e não vai entrar, ele vai entortar de algum jeito. Então, enquanto identidades, nunca vamos encontrar uma identidade que consiga penetrar e ultrapassar esses obstáculos, porque o problema desses obstáculos é justamente eles brotarem das identidades harmonizadas com algum tipo de paisagem, algum tipo de estrutura da roda da vida.

Sempre que estivermos numa estrutura da roda da vida, não teremos chance. Vai surgir algum tipo de loucura. Pode surgir, por exemplo, uma loucura fria, do tipo nazista. Se não procedermos dessa forma, vai surgir algum tipo de pensamento: “mas se eu fosse exato, perfeito, fizesse tudo exatamente como deve ser feito mesmo, aí eu obteria”. Dificilmente percebemos que isso é uma identidade surgindo dentro da roda da vida.

Quando isso surgir, vamos ter uma aversão intensa pelos seres que não fizerem exatamente o que estamos fazendo, isso pode acontecer. Vamos facilmente criar graduações, ou seja, nós aqui e os outros seres lá embaixo, os outros são a perturbação completa, então para eles a morte. E isso vai surgindo, o que é um pouco como se expressa a intolerância religiosa. Cada tradição religiosa, em algum momento, apresenta esse elemento de intolerância.


Acesse o vídeo do estudo 

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Autor
Coordenador
Praticante budista e instrutor de meditação. Desde 2011 dedica seu tempo à descoberta do coração desperto (bodicita), a partir dos ensinamentos de Buda e nas instruções práticas de Lama Padma Samten. Casado, pai de 2 filhos, é coordenador da Roda do Darma e tutor no CEBB.

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