# 2 | Como lidar com o orgulho?

orgulho
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Orgulho | Reino dos deuses

O orgulho é representado pelo reino dos deuses na roda da vida. É como se fosse uma espécie de absorção em si mesmo, uma auto-hipnose. Há uma busca por saúde física perfeita, fartura, regalias, conforto infinito; felicidade baseada na sustentação de aspectos materiais durante a vida, como por exemplo tornar-se milionário.

No dito popular: “nasceu em berço de ouro” ou “parece que tem um rei na barriga!” A ressaca dessa mentalidade se apresenta como fama, prazeres mundanos, fortuna, sedução, vaidade, auto-fascinação, perfeição, arrogância, deslumbramento, sucesso. Quando um ou mais fatores desses se estabelecem, surge uma falsa sensação de eternidade, por vezes externalizadas em corpos esbeltos, sorrisos gratuitos, conselhos vazios sobre a felicidade e a realidade.

Sucesso e esquecimento na mesma proporção

Olhamos e nem percebemos que desejamos um tapete vermelho por cada gesto nosso: “você quer um autógrafo?” Então, fazemos pose, desejamos estar na calçada da fama. Temos um esforço constante em criar e sustentar uma felicidade manufaturada onde nos achamos o centro do universo.

Há uma preocupação enorme na manutenção da própria autoimagem, um esforço para sustentar o sucesso adquirido e o medo de evitar o fracasso. Por exemplo, quando a mentalidade dos deuses se instala, temos um orgulho em dizer: “Prazer, sou isso!”. No reino dos deuses, tudo que fazemos é entrar nele cada vez mais, é viciante. É como se cada validação do nosso sucesso fosse uma amarra que se perpetua. Esse reino não é em si mesmo particularmente doloroso. A desilusão só vem depois… 

Orgulho – um veneno silencioso

De modo geral, há um jogo muito ardiloso onde surge um rei e os servos. A forma de sustentar essa mentalidade se dá essencialmente por meio de sedução: “Haverá revistas, capas de jornal, manchetes sobre minha pessoa? Já estão preparando uma biografia póstuma? Uma estátua com as medidas do original?” 

Quando a impermanência aparece, essa mentalidade logo se questiona: “fui enganado! Quem me colocou aqui? Como não pensei nisso antes!” Surge um profundo desapontamento. A insegurança antes escondida vem a tona: a angústia dos deuses é a sensação interna de abandono dos companheiros e companheiras.

Autossuficiência é um engano

Essa mentalidade se espanta ao saber que inevitavelmente irá transmigrar para um reino mais abaixo ou quando a morte está próxima: “não dá mais, e agora?” Surge uma tortura intensa por saber que o seu reinado está chegando ao fim. Há uma lamentação profunda por não ter previsto e/ou evitado a própria queda. As possibilidades de manipular a realidade se esgotaram. É comovente.  

A busca por elogios e o medo da crítica é um catalisador para se estabilizar essa mentalidade. Nesse sentido, entendemos a recomendação dos mestres:

A fama é como um eco; 

não procure o prestígio, 

mas sim a verdadeira natureza do prestígio 

~ Padampa Sangye

Devemos lembrar que os venenos da mente operam de maneira muito sutil. Devemos fazer tudo o que está ao nosso alcance para aliviar a angústia, o sofrimento dos outros. Precisamos desenvolver e fortalecer nossas qualidades positivas. Para ajudar alguém que está se afogando, precisamos saber nadar.

Essencialmente, quando nos sentimos orgulhosos, estamos fazendo manutenção de um espantalho. Aquilo de longe aparenta ser algo real, mas quando olhamos mais de perto percebemos que estamos nos enganando. 

Motivação

Na perspectiva da motivação, se estivermos fixados neste reino, não iremos nos dedicar ao caminho pois achamos que tudo está indo bem, as coisas estão caminhando maravilhosamente bem, “bem” conforme as nossas expectativas e medos. Nos embriagamos de felicidades temporárias até que a impermanência ou a morte nos sacodem.

Percebemos que as coisas não durarão para sempre: nós mesmos e os súditos da nossa realeza. Quando caímos dessa posição, encontramos o chão de forma abrupta. Então, podemos transmigrar para um reino abaixo ou reconstruímos a prisão do reino dos deuses. Ambos os casos exigem um tremendo esforço.  

Quando nos deparamos com essa mentalidade, brota em nós compaixão? Ou desejo de seguir perpetuando esse padrão?

Imagem de jacqueline macou por Pixabay

Autor
Coordenador
Praticante budista e instrutor de meditação. Desde 2011 dedica seu tempo à descoberta do coração desperto (bodicita), a partir dos ensinamentos de Buda e nas instruções práticas de Lama Padma Samten. Casado, pai de 2 filhos, é coordenador da Roda do Darma e tutor no CEBB.

2 comentários em “# 2 | Como lidar com o orgulho?

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