E se você soubesse que tem um botão de emergência, disponível, sempre que as coisas ao seu redor saem do eixo?
Você já deve ter visto um botão de emergência tipo aqueles no metrô. Eles são colocados em locais visíveis e quando acionados, têm a finalidade de parar o movimento do transporte, impedindo-o de danos maiores para os passageiros.
A questão do sofrimento, sua origem e cessação é um ponto sensível e fundamental no caminho budista. Existe um nível sutil de sofrimento, pouco comentado até.
É uma insegurança recorrente e sem uma origem propriamente dita. Você está desconfortável, com medo, tenso, reativo, e cada ato seu ou do outro faz você se sentir inseguro sobre quem é.
Bolhas de realidade
Esse distanciamento se dá dentro das bolhas, você se perde da realidade como ela é. Ao deixar de tocar o chão, flutua, teima em dar sequência às histórias mentais, por vezes desenfreadas, como se aquilo fosse tudo.
Ao final, está exausto e encontra recortes parciais e duvidosos sobre quem você é e como os outros deveriam ser. Você acredita que para viver bem, precisa se movimentar com muito esforço. Quando, na verdade, as situações podem ser transformadas em vantagem, desde que você esteja nu e aberto à sabedoria da vida, que chamamos de Prajna.
Ao ficar absorvido nas bolhas, você se engana e deixa de lado a sua naturalidade, sua humanidade, a ação mental que se dá antes de qualquer pensamento e reação, antes de qualquer “eu isso ou aquilo”.
Abertura dentro do que pode ser pensado
Em sânscrito, Vidya significa visão, clareza, abertura e lucidez. Avidya é o oposto, é a negação de vidya. Por estar inconsciente da sua essência, a sua verdadeira face, você se engana e segue a mente tacanha, no rastro da confusão, da paranoia e da neurose.
Esse engano nos molda e ao encontrarmos alguém, por exemplo, procuramos rotular essa conexão como positiva ou negativa. A mente estreita tem como lazer coisificar, congelar as coisas e as relações.
Os ensinamentos nos ajudam a discernir quando há traço de confusão ou não. Portanto, fixado à ignorância, você tem como guia o apego e a aversão.
Quando a ignorância se instala, você acaba por se descrever como “ou é, ou não é.” Essa visão estreita e dual é o problema, na visão budista. Avidya lhe hipnotiza e você nem cogita observar a vida com as quatro nobres verdades e tampouco se movimenta livre.
Avidya, o envelope, o olhar congelado e o sofrimento
Quando você descobre que olhar que congela é, viciado, se dá conta de que a falta de lucidez quanto essa operação mental, faz você ficar distante e ter a impressão de separatividade da mente como sujeito e objeto.
Por exemplo, quando você olha para um envelope, não vê mais papel, nem celulose, nem a impressão a laser da logomarca. As letras e as palavras ali presentes saltam aos olhos e ganham sentido, isso pela luminosidade da mente.
Para vermos um papel como envelope, precisamos de uma operação mental que o legítíma como tal. Uma traça vê outra coisa ali, enxerga alimento. Será mesmo que uma traça se pergunta se o tamanho do papel é A4 ou A6?
Avidya: e como faz para apertar o botão de emergência do sofrimento?
Prajnaparamita é a ferramenta para localizarmos e trabalharmos com os desejos e apegos, tanto os visíveis, os latentes e também os invisíveis. Com esse olhar disponível, nós temos liberdades adicionais.
Podemos entrar e sair dos lugares, sem afundarmos junto à confusão e ainda por cima, ajudar os seres a ampliarem a sua visão. Ampliar visão é perceber como estamos direcionando nossas vidas e ações.
Saramago diz:
“Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos.”
Mover-se por gostar ou não gostar é investir no próprio fracasso.
Quando o seu olho brilha para as coisas, para as relações, e tem como referencial avidya, você entrega, permite ao objeto, a pessoa, a situação, deles regerem a sua energia, o seu ânimo, o seu dia. Esse é o 1º elo na sequência de 12 elos, da origem dependente.
Até quando você deseja seguir refém desse processo chamado avidya e ficar acorrentado à origem dependente? O que não flutua em você além das descrições que você julga ser?
O que você descobrirá nesse episódio?
- Avidya
- Sofrimento
- Operação mental
- Luminosidade/ Ocultação
- Liberdade natural da mente
- Automatismos como processos de inteligências fechadas
- Sujeito-objeto, vijnana.
- As quatro nobres verdades
- O olhar congelado para si e para o outro
- Impermanência/ Vacuidade
- Cositude, a coisificação das coisas e pessoas
- Pensar, contemplar e repousar
- Inseparatividade
Ouça agora: “Avidya é o botão de emergência do sofrimento?”