A IMPORTÂNCIA DOS ENSINAMENTOS PROVISÓRIOS

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Por Lama Padma Samten.

Vamos pensar assim, nos ensinamentos provisórios… Primeira nobre verdade, o sofrimento. Vamos entender a primeira nobre verdade como ensinamento provisório porque o sofrimento vai terminar sendo extinto. O ensinamento que não é provisório é sobre a natureza primordial, algo final que está incessantemente presente, além do tempo, do espaço, da identidade, das circunstâncias… Aquilo que é definitivo, final.

Os ensinamentos provisórios incluem primeira nobre verdade. A segunda nobre verdade é meio intermediária, porque se a gente aprofundar na segunda nobre verdade, que são as causas do sofrimento, termina alcançando a liberação do sofrimento também, daquilo que não é sofrimento. A terceira nobre verdade decorre da segunda. Entendendo a artificialidade da segunda nobre verdade, brota a terceira nobre verdade: nós podemos atingir a liberação. E então, vem a quarta nobre verdade, que começa com motivação, as ações negativas que deveriam ser evitadas, as ações positivas a serem praticadas. São verdades provisórias de um caminho.

Depois, vem diana, que corresponde à shamata. Esse aspecto também ainda é uma artificialidade. Se nós nos prendermos à diana, não conseguimos ir adiante, porque diana pode parecer que é o ponto final do caminho mas não é. A gente precisa ultrapassar diana. Então, seis dos oito passos são claramente ensinamentos provisórios, que não apontam o aspecto último. O sétimo passo não aponta o aspecto último, mas já passa junto, ele vai falar de algum modo em que seja possível entender ou intuir a sabedoria primordial, rigpa.

Esses ensinamentos são um pouco como remédio. Especialmente entre as pessoas ligadas a uma certa postura, evitamos tomar remédio. Se a gente puder se curar sem remédio é melhor. Mas, por vezes, precisamos de remédio. Às vezes, por exemplo, as pessoas consideram a forma de viver um remédio. Elas fazem exercício porque aquilo é melhor, dormem em certos horários, tomam mais água… Isso não é um remédio totalmente, a pessoa não tá tomando saúde, mas é bom fazer aquilo para preservar a saúde. Não é a saúde, mas ajuda para que a saúde aconteça. Em algumas circunstâncias mais complicadas, vamos tomar remédios mesmo. Todos os remédios têm contra-indicações, então tomamos querendo escapar do remédio. Esse é o ponto.

Então, os ensinamentos provisórios são isso, remédios. E eu considero esses remédios de grande importância. Se nós, por exemplo, não considerarmos o tema da moralidade, não acho possível avançar de fato, porque pessoa avança um pouco. Aí pelas práticas negativas que a pessoa faz, estabelece relações negativas ao redor, ela de repente não tem mais tempo e é tomada por impulsos que brotam e caem por cima dela.

Se não estabelecer uma base de moralidade no sentido de evitar o máximo que puder as dez ações não virtuosas e praticar as quatro qualidades incomensuráveis e as seis perfeições, se não gerar méritos e não evitar os carmas, ainda que aparentemente isso sejam níveis condicionados e transitórios de ensinamentos, a pessoa não consegue avançar. Porque ela está dentro de um ambiente em que o que acontece ao redor influencia sua própria vida. A pessoa não está em um nível de liberação. E se estiver, também não vai fazer as ações porque já está liberada daquilo. Mas se tiver níveis de apego e por isso faz ações negativas, ela vai colher a consequência das ações, isso é inevitável… É assim.

Está certo que pessoa pode ser socorrida, pode gerar méritos, pode gerar méritos de sabedoria transcendente e começa a ultrapassar isso, manifestar um nível de liberdade em relação às ações negativas que foram feitas. Na verdade, se não fizer isso, não tem solução, porque só pelos méritos não escapa também. Mas gerando méritos e evitando as estruturas cármicas, ela avança. Agora, se tiver a sensação de que tem uma visão muito ampla e por isso pode fazer ações não virtuosas a partir de impulsos que brotam, vai ter problemas.

Então, as ações não virtuosas e as ações virtuosas, o carma e o mérito se referem a ensinamentos provisórios, mas na medida em que a pessoa tem uma ligação a um mundo causal está suscetível a isso. Se não se comportar de uma forma adequada, vai ter problemas. O próprio Guru Rinpoche, ele mesmo dizia que cuidava com muita delicadeza das ações, para não fazer ações inapropriadas. E ele era um buda.

Mesmo que a pessoa tenha os ensinamentos muito elevados, se entrar no âmbito das bolhas de realidade sem se dar conta disso, ou se dando conta disso mas reagindo através de desejo e apego ou operando a partir dos doze elos da originação dependente, vai ficar aprisionada e as ações que fizer vão estar na dependência de vedana, trishna, upadana, não são ações livres. Ela espera o resultado da ação, que deveria ser algo que a agradasse. Isso significa a prisão ao processo usual.

A pessoa pode imaginar que está muito livre, que viu muitas coisas, mas se ela tem o impulso das ações negativas sem lucidez quanto a isso e fica na dependência da retribuição que espera que as ações produzam, ela está presa. Então, ela precisa dos ensinamentos provisórios.

Lama Padma Samten, em 07/03/2018, nos ensinamentos ao vivo.

Autor
Coordenador
Praticante budista e instrutor de meditação. Desde 2011 dedica seu tempo à descoberta do coração desperto (bodicita), a partir dos ensinamentos de Buda e nas instruções práticas de Lama Padma Samten. Casado, pai de 2 filhos, é coordenador da Roda do Darma e tutor no CEBB.

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