Para que serve a separatividade? Qual o propósito de se compreender avidya?
O bodisatva ou aspirante a iluminação, começa a entender que a origem dependente é uma ação mental possível. Nós não conseguimos recuperar a liberdade natural da mente por resolver, controlar ou manipular. Avidya possui o aspecto de brilho e ocultação, como experiência inseparável.
Chegamos à raiz do sofrimento, avidya. A prisão da separatividade se dá através da compreensão dessa experiência vista pelo avesso.
Entendemos que a luminosidade produz brilho e ocultação, na mesma experiência. Nesse ponto, é como se a sabedoria Prajna pregasse uma peça conosco. É como alguém que se engana diante de uma experiência e leva um susto, mas entende que aquilo é apenas um susto. Não afunda junto. Apenas o que é enganoso afunda.
Separatividade ou olhando de fora para dentro
O primeiro elo da Roda da Vida inclui os 3 animais, as 6 paisagens e os 6 aspectos apresentados abaixo.
Assim, as 6 formas de avidya são:
- Separatividade
- Criação
- Cegueira
- Experiência de mundo
- Fechamento
- Escuridão espiritual
Nesse podcast, vamos conversar sobre o efeito da primeira forma: a separatividade.
Avidya como separatividade
No Sutra do Coração, Chenrezig olha às aparências com lucidez. Ele diz: Forma é vazio, vazio é forma. Forma nada mais é do que vazio, vazio nada mais é do que forma. Ele nos convida a olhar: aquilo que você aponta fora, veja como vacuidade, veja como luminosidade, pois é brilho e ocultação.
Operarmos a luminosidade sem a sua compreensão, nos faz lutarmos contra as imagens mentais e assim, perpetuamos o samsara.
Com a vacuidade mal-humorada, procuramos desmontar os objetos e situações com o intelecto, negando o que se apresenta. A ideia é fazer diferente: vamos usar do próprio movimento da origem dependente e ver a luminosidade operando.
Logo, porque aquilo aparece, vemos a própria natureza da vacuidade. Não são duas coisas opostas — a luminosidade e a vacuidade. Em essência, temos luminosidade. Sem fixações, não perdemos de vista o aspecto vazio do que se apresenta como luminosidade.
Se você estiver fixado, solidificará as imagens mentais (2° elo da roda da vida, samskara) e irá em busca de objetos, situações, relações, que sustentem essa energia em uma direção favorável. Evitará o que é desfavorável para agarrar esse movimento e assim, terá a sensação de que aparências são autônomas em relação a nossa própria mente.
Em seguida, você sentirá a necessidade de responder de maneira obediente ao que surge e depois entrará em crise, pois perde a visão mais ampla.
O raio-x da separatividade em ação
Buda Shakiamuni usa a analogia do um mágico e seus truques. Ele cria a ilusão e, em seguida, fica preso como se aquilo fosse tudo. Nós somos Budas e estamos embriagados com a luminosidade da mente. A questão é que ainda duvidamos da nossa capacidade de estarmos sóbrios novamente.
É isso. Se você pedir para um alcoólatra parar de beber, apenas ele é capaz de sair dessa.
Nós vamos olhar com profundidade as experiências. Mas, antes disso, não vamos “coisificá-las”. Coisificar é operar e fixar a mente com a origem dependente e depois de um tempo, você enjoa e descarta o que foi desejado.
Para que possamos perceber (Pensar, contemplar e repousar) a separatividade e discernir, vamos procurar onde está o agente da originação dependente, o suposto “eu”. É necessário reconhecer que a separatividade, ela não é algo que vem de fora: eu estou aqui e o mundo está lá.
Usemos uma garrafa de vidro, por exemplo. Você encosta a mão na garrafa e… ali é vidro. Temos uma delusão operando.
Um exercício prático de separatividade e a garrafa de suco de manga
Portamos a experiência interna de garrafa sustentada por um tempo, como garrafa, junto ao objeto concreto, o vidro. O substrato dos objetos é um espelho do nosso horizonte mental. Não temos os seus atributos materiais, físicos 100% estáveis.
Alguém preso nos infernos poderá achar que a garrafa é uma arma ou se ela estiver com cheia de suco de manga, por exemplo, este pode estar envenenado para matar ou prejudicar outra pessoa.
Quando dizemos que isso é uma garrafa, estamos presos. Vimos que a garrafa não é uma garrafa em si mesma.

Ela é de vidro ou plástico? temos o “não é” uma garrafa. Por fim, temos a experiência de garrafa como interna e externa, ao mesmo tempo.
Caminhar dentro e fora da solidez, da bolha, é regozijar-se. “Isso é, isso não é. Mas é!” Assim, usamos a separatividade como caminho. Essas são as 3 afirmações de Maitreya.
O primeiro “isso é” é um extremo da realidade, eternalismo. “Não é” é niilismo, negação. Interesse e curiosidade aberta surge como Caminho do Meio. Esse é o despertar da originação dependente como liberdade interior.
Quanto mais separado for, mais apego teremos. A separatividade será despercebida e perderemos a liberdade original de poder sustentar a garrafa como uma experiência possível. Em vez de seguir rígido vendo a garrafa somente como garrafa ou a minha garrafa, precisamos relaxar diante desse aprisionamento. Suponhamos que a garrafa de vido quebre, o que acontece com a garrafa interna que portamos? Ela se quebra também.
Origem dependente é a sabedoria Prajna. É liberdade de usarmos a mente em movimento, como a própria liberação do samsara. Tudo que precisamos está ao alcance dos nossos pés.
O que você descobrirá nesse episódio?
- Avidya como exercício de liberdade da mente
- Separatividade: como olhar para dentro sem se enganar?
- Origem dependente como luminosidade e vacuidade
- “Isso é, não é. Mas é”
- O exemplo prático da garrafa de suco de manga
Ouça agora: 6 formas de avidya | #1 separatividade